top of page

As danças folclóricas egípcias são muito diversificadas e representam, em geral, as principais comemorações originárias dos camponeses, dos pescadores e as expressões religiosas aí implicadas.  No Egito, Mahmoud Reda revolucionou o folclore local. Portanto, conhecer a sua trajetória é fundamental para a compreensão das danças folclóricas egípcias.

MAHMOUD REDA

É impossível separar a história da vida de Mahmoud Reda da de seu grupo de dança folclórica egípcia, pois elas estão intimamente ligadas. Nascido em 18 março de 1930, no Cairo, ele levou a dança oriental, do Egito, para os palcos do mundo. Solista, ator, bailarino e coreógrafo em vários filmes egípcios, foi reconhecido por muitos como o Fred Astaire da dança oriental. Diretor de centenas de produções esteve em tournée por mais de 60 países, apresentando performances nos mais prestigiados teatros do mundo. Nos anos 1950, os grupos folclóricos estavam em alta na Europa e em países socialistas. Inspirado por Igor Moisseiev, com quem estudou, Reda criou a companhia The Reda Troup.

THE REDA TROUP

A Reda Troup, fundada em 1959, foi a primeira companhia de dança folclórica egípcia. The Reda Troup, no início, era composta de quinze bailarinos. Ela chegou a ter mais de 150 membros, incluindo bailarinos, músicos e técnicos. Essa companhia apresentou mais de 300 shows e participou de dois filmes musicais: Mid year vacation” e Love in Elkarnak. Muitos membros da companhia de Reda tornaram-se famosos, como os professores mestres Raqia Hassan, Momo Kadous, Mo Geddawi e Yousry Sharif. A lendária Farida Fahmy foi co-fundadora e  primeira dançarina da Reda Troup. Por 25 anos, teve a sua história vinculada a essa companhia de dança folclórica. Ela atuou no papel principal da trupe e elevou a dança ao patamar de fina arte. O estilo, a elegância e a graça originais ainda inspiram gerações de dançarinos que acompanham as suas audiências e apresentações no Egito e no exterior. A dedicação, disciplina e o compromisso serviram de exemplo a bailarinos que integraram a companhia posteriormente.

Raqs Assaya (Dança com Bengala)

Conhecida também por dança Said, a Raqs Assaya utiliza o ritmo de mesmo nome em suas músicas, com o uso dos instrumentos como mizmar (flauta) e table (percussão).  As mulheres também passam a desenvolver uma versão feminina do Tahtib, utilizando bengala de pastoreio, com a curva para baixo, em substituição aos bastões de bambu. O traje típico das mulheres é um vestido ou galabee (túnica egípcia), xale amarrado no quadril e lenço na cabeça, ambos podendo ser adornados com moedas e contas. Os instrumentos da música são enfatizados por saltitos e movimentos com a bengala. À dança, são incorporados passos do baladi agregando delicadeza e graça a ela.

Rack’s al Balaas (Dança do Jarro)

A dança Rack’s al Balaas demonstra a alegria das pessoas dos povoados egípcios a caminho do rio Nilo para encher seus jarros d’água. A dança do jarro é realizada apenas por mulheres e está ligada à importância da água para esses povos. Normalmente, cabe à mulher a tarefa de dirigir-se aos rios em busca de água. Nas coreografias desenvolvidas por Mahmoud Reda, para preservar esse costume, as bailarinas equilibram jarros acima

de suas cabeças representando a habilidade das mulheres na execução dessa atividade. A dança do jarro é uma dança alegre e celebrativa e essas características devem ser evidenciado nas coreografias desse estilo.

Danças Fallahi

 

As danças chamadas Fellahin ou Falahi são originárias de pessoas simples que trabalham no campo e comemoram seus festivais e colheitas com danças e cantos. O ritmo utilizado nessas danças também é chamado de fellahi ou fallahi. No Delta do Egito, além dos camponeses, também existem pelo menos dois grupos Ghawazee: o Sumbati Ghawazee (famoso por seu "estilo atlético", incluindo shamadan e dança equilibrando uma cadeira nos dentes) e o Ghawazee de Tanta (famoso por seus músicos e pela flauta nye, originária da região).

 

Dança dos Pescadores

 

A dança dos pescadores é realizada tanto por homens como por mulheres. Nesse caso, os homens simbolizam os peixes. A rede, nessa dança, pode ser real ou imaginária, representada através de mímica. O ritmo usado é o Fallahi. O traje é de marinheiro (coletes, calças e bonés). Não é muito comum assistir apresentações desse estilo no Brasil, mas existem coreografias inspiradas em Mahmoud Reda que retratou esse costume egípcio em seus shows.

Raqs Baladi

No Cairo, a dança é predominantemente realizada por mulheres. O local é a base para o estilo conhecido por Raqs Baladi e Oriental egípcio. Quando referem-se à dança egípcia em qualquer lugar do mundo, e mesmo dentro do Egito, é o Oriental dance do Cairo que se destaca. A postura e expressividade típicas da bailarina que realiza essa dança são extremamente peculiares e para reproduzi-las a bailarina não pode ser muito tímida. O Cairo também é o local de origem das companhias nacionais de dança, como a mais famosa, criada por Mahmoud Reda e Farida Fahmy  já mencionados no texto acima. Nesta, companhia de folclore, a dança foi   pesquisada a   partir de regiões   do   Egito e levada

para o palco do teatro. Além disso, o Cairo foi o principal centro de gravação do Oriente Médio, e seus Orientale Filme Stars e Night Club lançaram dançarinas e artistas lendários. Na região, também encontram-se  o Baladi Awad(versão feminina com taksin e progressão de instrumentos melódicos e percussão) e Tet Baladi  (onde homens  dançam) e uma variedade de estilos, como o Shaabi. Entre as danças coreografadas por Mahmoud Reda, atribuídas ao Cairo, está o Milaya Laff, uma das mais famosas.

Milaya Laff

 

A dança Milaya Laff é característica da região próxima ao Cairo denominada Ghouria, e surgiu de uma moda entre as egípcias. As mulheres nos séculos XIX e início do século XX, quando saíam de casa, usavam um tecido preto, grande e pesado, o Milaya (véu), enrolado (Laff) ao corpo. Nas cidades como Alexandria, Cairo e Port Said, o véu era um elemento quase obrigatório, fazendo parte da moda e dos costumes. Além dele, as mulheres usavam como acompanhamento desse traje uma espécie de shador ( lenço  que cobre o rosto chamado de bur-ha) feito em crochê de cor preta, com trama aberta que mostra um pouco o rosto. A mulher bint al-baladi ( filhas da terra) usa o Milaya laff  para se cobrir, quando vai aos mercados. Suas roupas são coloridas por baixo do véu, com sandálias ou tamancos nos pés, lenço na cabeça, jóias e maquiagem destacada nos olhos. Na dança Milaya laff, toda essa representação é evidenciada, tanto no traje da bailarina como na sua atitude descontraída em cena. Com esse véu, elas realizam variados movimentos, cobrindo e descobrindo o corpo e agitando o véu. A dança Milaya é interpretada de forma teatralizada, que utilizam a dança baladi como base coreográfica. A famosa dançarina Fifi Abdou apresentou uma coreografia de Milaya Laff, que está registrada em vídeo, quando dançou na praça de Azbakia, no Egito, popularizando esse estilo.

Shaabi

 

Shaabi quer dizer popular.  O estilo surge das canções de duplo sentido que começaram a ser lançadas, com sucesso, pelo cantor egípcio Ahmad Adaweia, em 1971. Com a influência dele, surgem outros artistas que começam a praticar desde cedo as improvisações vocais típicas do shaabi chamadas mawals.  Essas canções retratam os anseios, os sonhos e as dificuldades da classe trabalhadora, contém expressões e gírias populares (ligadas a temas do cotidiano, como sexualidade), fazendo menção às diferenças entre as classes sociais egípcias. No shaabi, os sons

que constituem as músicas refletem o espírito do povo egípcio do subúrbio. Muitas vezes, compõem o repertório sons de carro, de telefones tocando, por exemplo. Outros países do norte africano, como o Marrocos e a Argélia, têm suas músicas estilo shaabi, cada um com suas características distintas. Atualmente, o shaabi é um estilo bastante divulgado e apreciado pelos jovens egípcios, pois não se limita à dança ou ao estilo musical, mas a tudo o que remete à classe popular. Para dançar o shaabi, é preciso identificar os instrumentos, compreender a letra ou, pelo menos, o tema da música para que isso se reflita nas expressões facial e corporal da bailarina. É preciso saber utilizar os gestos, mas ter o cuidado para mesclar as mímicas (na interpretação gestual) com a técnica de dança. No shaabi, os movimentos são mais simples, descontraídos, diferentes de uma dança mais clássica oriental.

Haggalah

 

 

Acredita-se que a palavra hagallah venha do árabe hag’l, que designa saltar, pular. É uma dança realizada em conjunto com os noivos no Zaffa (procissão), celebração que acontece normalmente na época de colheita. Hagallah é um termo amplo designa à dança, a música e a essa celebração. Familiares e amigos acompanham os noivos com cantos e palmas, mostrando sua solidariedade. A figura central da festa é uma dançarina que pode ser membro da família da noiva. Essa dançarina pode estar total ou parcialmente coberta por véus. Ela dança à frente do homem, o kefaffen, conduzindo a procissão com passos curtos e shimmies (tremidos de quadris). Essa dança executada não representa uma disputa entre homens e mulheres, mas o poder entre esses gêneros. A mulher pode portar um bastão ou um véu em suas mãos No final da cerimônia a dançarina ajoelha-se diante   do   kefeffen,   entregando-lhe  seu  bastão  e seu véu.

Em troca, ele oferece um ou dois braceletes como símbolo de força e sorte diante da proposta de casamento. O jogo sedutor na festa de casamento é muito complexo e, hoje, deturpado nas grandes cidades e não representa o que era originalmente.

Danças Beduínas

 

As danças beduínas apresentadas por diferentes grupos folclóricos profissionais diferem de acordo com a tribo a que pertencem e podem ser realizadas por homens e mulheres. Os passos e as posturas variam de acordo com os costumes e as tradições de cada povo beduíno, assim como já foi descrito em algumas dessas danças mais conhecidas. As pessoas simples, das regiões mais afastadas do deserto, executam uma dança repleta de simbolismos, pois os gestos têm significados que contam um pouco da história e do cotidiano delas. Normalmente, a dança, alegre, exalta a beleza do deserto e das mulheres. Os beduínos usam trajes coloridos, muitos ornamentos em prata e pedrarias, possuem pinturas e tatuagens nas mãos e no rosto, cobrem a cabeça e o rosto com véus pesados. Na dança beduína, há marcações fortes dos pés, com batidas no chão, movimentos (acentos) de quadril, como twists e shimmies. As mãos e os braços movimentam-se intensamente e reproduzem gestos e símbolos. Muitos profissionais convivem com as tribos beduínas para adaptar as danças a espetáculos teatrais.

  Danças Ghawazee

 

A palavra ghawazee significa ‘invasoras’ ou ‘estrangeiras’ (no singural, ghazi é masculino e ghaziyah é feminino). E as ghawazee de fato sempre viveram nos subúrbios das cidades e às margens da sociedade. Atualmente, o termo é usado para um grupo específico de dançarinas/cantoras de origem Sinti (uma ramificação linguística

diferente das ‘ciganas’ da Índia) que atuam no Egito. As ghawazee tinham origens diferentes, sendo assim, os trajes que elas usavam também podiam variar, bem como os acessórios utilizados nas suas danças. Dentre as ghawazee mais renomadas, estão as bailarinas conhecidas por irmãs Maazin.

Danças Núbias

Há realmente uma grande variedade de danças Nubian. Anteriormente, os povos núbios eram de diferentes grupos em muitas aldeias espalhadas ao longo da extensão do Rio Nilo. Algumas danças são provenientes dos povos Kensi e Fadiki e outras delas são dos grupos de imigrantes árabes (Khaliji). A característica básica das danças Nubian são as marcações fortes de pés e os movimentos enfatizados nos braços e ombros, com bastante agilidade nos quadris.  Os participantes dessas danças movem-se sincronizadamente para frente, trás ou lado e em direção ao centro. As roupas são coloridas com túnicas para homens e vestidos amplos e longos para mulheres.  Há atribuições diferentes para homens e mulheres, com desenhos de formações em linhas e círculos. Nesta região, também é possível encontrar estilos de dança Arageed, Soki e Nagrashod.

Rack’s al Shamadan (Dança do Castiçal ou Candelabro)

 

A dança Rack’s al Shamadan é relacionada às comemorações como casamentos e nascimentos. Sua origem não tem registros precisos, mas acredita-se que a dança como parte dos festejos de casamento, começou no início do século XX. Embora há indícios de que ocorriam apresentações similares desde o império Otomano. A procissão de casamento (Zaffa) é uma festa que dura em média três dias. Em muitos festejos, a dançarina com candelabro precede a comitiva dos convidados acompanhada por tocadores de pandeiros e cantores profissionais. Inicialmente, as velas ficavam em uma armação metálica, e não em candelabro tradicional. Na cabeça, a dançarina levava um grande um prato de metal com uma taça de fogo, mostrando uma habilidade surpreendente. Posteriormente, candelabros que podiam ser ajustados à cabeça foram criados especialmente para a dança. Geralmente, a dançarina toca snujs (instrumento no formato de discos metálicos usado nos dedos), usa vestido, dança ritmos mais lentos, como o próprio Zaff (ou el zafi). É uma amostra de técnica e habilidade por parte da bailarina que dança equilibrando o candelabro à cabeça, com velas acesas. Atualmente, é um acessório para shows estilizados que mantém pouco do estilo utilizado no Zaffa. Uma variação dessa dança surge mais tarde, com a utilização de taças. Alguns acreditam que essa dança tenha surgido no ocidente, como uma versão inspirada no Rack’s al Shamadan.

Muwashahat ou dança árabe andaluz

 

 O estilo de dança Muwashahat é originária de uma forma sofisticada de poesia muwashah (singular de Muwashahat), escrita em árabe clássico, geralmente em cinco estrofes, com um refrão que se repete, através de padrões rítmicos. Este gênero de poesia musical se originou na Espanha Islâmica durante o século dez, quando os muçulmanos conseguiram atravessar do Marrocos para a região da Andaluzia. Através dessa jornada, houve uma interação cultural, principalmente na música. Por esta razão, algumas bailarinas consideram que é uma dança original de Al-Andalus. Entretanto, muwashahat é um estilo de dança criado pelo coreógrafo Mahmoud Reda, que pesquisou a dança  e os figurinos típicos da dança andaluza para compor uma coreografia incorporando passos inspirados no ballet juntamente com a técnica da raks sharqi. Esta coreografia de dança muwashahat foi apresentada no palco pela primeira vez no Cairo em 1980. A versão musical do muwashahat, utilizada nessa ocasião já estava modernizada, ritmos foram trocados por outros mais curtos e mais dinâmicos, mas mantendo a sua forma essencial, apesar da inclusão de instrumentos ocidentais e uma harmonia mais simples. As letras dos poemas reeditados ainda retinham o idioma clássico e a metafórica forma descritiva da poesia muwashahat, cujos temas variavam entre natureza, amor, louvor a Deus.  A dança é muito elegante, com bailarinas deslizando em cena como seres encantados, utilizando passos suaves, mas com muita expressividade, movimentações de braços muito leves com poses marcadas. O traje também remete a memória das danças palacianas persas.

Tannoura

 

A dança folclórica Tannoura originou-se de uma forma de ritual dos muçulmanos sufis do Egito (cuja finalidade é a invocação a Deus). Os dervixes em Konya, na Turquia, realizam também essa dança marcada por giros ininterruptos, porém de forma mais estática.  .  Na Tannoura os dançarinos executam giros rítmicos sequenciais com suas multicoloridas saias bordadas com motivos egípcios. Ao girarem, o público vislumbra as formas e cores mais incomuns, todos derivados dos padrões geométricos e cores brilhantes em seus trajes. As saias usadas pelos dançarinos evoluíram ainda mais, e por vezes, incorporam tubos de luzes que se acendem com os movimentos.

Zaar

 

Zaar é mais um ritual de transe que uma dança. O ritual pode variar de acordo com o lugar e as pessoas onde é realizado, mas normalmente é desempenhado apenas por mulheres. O ritmo utilizado para esse ritual é o ayub e suas variações. Com o uso de movimentos repetitivos, hipnóticos, muito incenso e até sacrifício de animais, essa dança ritual está associada à cura dos males do corpo e da alma. Quando esse ritual é realizado no palco em formato de coreografia ou encenação, utiliza a base de movimentos do Zaar de forma estilizada. Os movimentos mais usados são os giros, flexão para frente e para trás de tronco e cabeça, realizados de pés ou de joelhos, movimentos vigorosos e giros com a cabeça. É preciso que a bailarina conheça com alguma profundidade os significados do Zaar para representa-lo em cena, valendo-se de uma licença artística para a sua performance.

Guedra

 

Dança ritual associada aos tuaregues, conhecidos como povos do deserto “abandonados por Deus”, que levam uma vida solitária, distante de todos.  É um ritual noturno, em torno do fogo sob a luz da lua ou dentro de uma das barracas onde vivem. Guedra é uma dança de invocação realizada por mulheres que a executam de joelhos. A energia é transmitida através de movimentos dos dedos das mãos e do punho, extremidades do corpo pintadas de henna. . É uma dança ritual de bênção, paz e transmitir amor espiritual. Geralmente é feito em um círculo em que todos podem participar, embora a figura central do comando seja do sexo feminino. A cabeça da dançarina no ritual é coberta por um véu azul ou preto, que representa as trevas e a falta de clareza. No percurso do ritual, ao ritmo crescente dos tambores e dos participantes em transe,  a cabeça é tocada com os dedos através do véu, até que seja removido. Ao final do ritual são saudados os pontos cardiais e realizados gestos cheios de simbolismos. As roupas podem variar de acordo com a região onde esse ritual é realizado, normalmente são trajes pesados, com vários elementos e camadas de tecidos. Quando se propõe reproduzir essa dança teatralmente, o figurino é adaptado para que a bailarina tenha maior agilidade. Como nas outras danças ritualísticas, a montagem coreográfica leva em conta elementos do ritual com adaptações cênicas.

.

bottom of page